Caracas, 1 jun (Prensa Latina) A Venezuela guarda uma história cheia de amor que transcendeu o tempo para se tornar um exemplo de relacionamento, onde a visão de mundo original nos legou um símbolo do quanto o ser humano pode fazer para defender sua identidade.
Kueka não é uma avó comum. Dizem que ela é um espírito ancestral, uma testemunha da criação, que vive em uma pedra de jaspe vermelho que pesa nada menos que 25 toneladas. Ela é venerada pelo povo Pemón, uma comunidade indígena que vive principalmente no Parque Nacional Gran Sabana e Canaima, no sudeste da Venezuela.
A Kueka Pachi (na língua Pemón Taurepán, “há três etnias”) significa Pedra da Avó, e talvez sua história não fosse tão conhecida se não tivesse sido roubada ilegalmente por um alemão no final do século ado, com a cumplicidade do governo no poder, para levá-la a um parque daquele país.
Em 1998, o artista e negociante Wolfgang Kraker von Schwarzenfeld removeu a pedra de seu ambiente natural e a trouxe para a Alemanha para ser exibida em sua exposição Global Stone no Parque Tiergarten de Berlim, onde ela teve que ser esculpida para exibição pública.
O que poderia ser visto como algo trivial, “por amor à arte”, desencadeou uma longa luta reivindicativa de anos por parte das comunidades indígenas, às quais se juntou o novo Estado Bolivariano do Comandante Hugo Chávez, para conseguir o retorno definitivo aos seus anteados.
Se von Schwarzenfeld viu um valor cultural e comercial na imensa rocha, o povo Pemon sentiu suas almas, suas próprias vidas, sendo arrancadas deles, já que a Avó Kueka é um símbolo de proteção e bem-estar para essas comunidades, onde sua filosofia de vida se concentra no equilíbrio essencial dos ecossistemas.
Em sua cosmovisão original e ancestral, retirar a pedra sagrada de seu lugar natural significava romper o equilíbrio dos sistemas ecológicos amazônicos e colocar em risco a biodiversidade – ou seja, sua própria existência – mas também significava retirar do Parque Nacional Canaima um valor inserido em um território declarado Patrimônio Natural da Humanidade (1994).
Duas décadas depois, em maio de 2018, xamãs Pemon viajaram para Berlim e, em meio à batalha judicial por seu retorno, profetizaram o retorno iminente da Avó com um ritual de cura com pedras. Esse ritual aconteceria em 16 de abril de 2020, quando o porto de Guanta, no estado de Anzoátegui, testemunhou sua repatriação.
Seu retorno à Gran Sabana venezuelana foi motivo de alegria e felicidade, não apenas pelo retorno, mas também pelo reencontro com o avô Kueka, com quem ela havia sido fundida por amor milênios antes, amaldiçoado pelos deuses.
(Retirado de Orbe)
hb